Releasing the Seals

 

Eis que surgem sobre os céus e sobre os quatro cantos da terra

E vi a direita do que estava assentado sobre o trono um livro escrito por dentro e por fora, selado com sete selos.

Um ser, brada com grande voz: Quem é digno de abrir o livro e de desatar os sete seus selos?

E ninguém nos céus, na terra, nem debaixo da terra, podia abrir o livro, nem mesmo olhar para ele.

Havendo o dito cordeiro aberto um dos selos, olhei, e ouvi uma voz sussurrante, que dizia:

- Vem, e vê.

E olhei, e eis um cavalo branco, o que estava assentado sobre ele tinha um arco, de exata semelhança ao Cordeiro, lançando sua sombra sobre a terra e os Céus, e foi-lhe dada uma coroa, e saiu vitorioso, e para vencer.

E, havendo aberto o segundo selo, a voz disse:

- Vem, e vê.

E saiu outro cavalo, vermelho, e ao que estava assentado sobre ele foi dado que tirasse a paz da terra, que se matassem uns aos outros, foi-lhe dada uma grande espada.

E aberto o terceiro selo, a voz se inflama e brada como um trovão:

- Vem, e vê.

E olhei, e eis um cavalo preto e o que sobre ele estava assentado tinha uma balança em sua mão.

Aberto o quarto selo, ouvi algo que parecia tocar minha alma, que dizia:

- Vem, e vê.

Olhei, e eis um cavalo amarelo, o que estava assentado sobre ele tinha por nome Morte e o inferno o seguia, foi-lhes dado poder para matar a tudo que é vivo sobre a terra, com guerra, fome, peste e com morte.

E, havendo aberto o quinto selo, vi debaixo do altar, as almas dos que foram mortos.

E, havendo aberto o sexto selo, olhei, e eis que houve um grande tremor de terra, o sol tornou-se negro e a lua escorria como sangue.

Aberto o sétimo selo, fez-se silêncio nos céus e em todo canto da terra.

Eis que paira sob os céus o semelhante ao cordeiro montado em seu cavalo branco.
Ao lançar seu olhar sobre a terra, todos os homens que estavam ao seu alcance, são tomados pelo impulso da insensatez e coisas que antes eram consideradas proibidas, agora eram tidas como necessárias, assim sob o olhar atento do Cavaleiro, os homens espalham a boa nova, e dizem que o escolhido voltou, trazendo um tempo de melhoras onde todos que crêem nele serão poupados.

Essas palavras são música para os ouvidos do cavaleiro, os sussurros de alegria dos humanos, pobres criaturas, não sabem diferenciar o real da ilusão, tão facilmente manipulados, basta um olhar, um sorriso, um pequeno aceno para que façam a sua vontade, meros bichos de estimação, não passam disso.

Agora que a crença no retor do escolhido já de propagou, o campo já está preparado para os próximos, os outros quatro, que são os piores pesadelos para os homens, mas que foram criados a partir do próprio sentido humano, que deixaram os homens implorando pela morte, e esses mesmos homens não conseguindo alcançar a morte, apenas irão morrer quando um de nós achar que isso se faz necessário, ou divertido talvez.

Meros bichos de estimação, nada mais que gado.

Pequenas nuvens de fuligem sobem da terra quando os cascos do cavalo tocam com passos firmes o chão e Guerra observa o resultado da sua sombra sobre o que antes era um pequeno vilarejo. Alguns metros a frente os resto de um corpo não conseguem nos contar de que como viveu, mas mostra de forma clara que seu sofrimento em morte foi gigantesco, a carne dos ossos estava faltando em vários lugares, a cabeça era uma massa sem forma de cabelo, ossos, terra e mais coisas indecifráveis, mas sem duvidas o pior eram as queimaduras, que em suas pernas chegaram a lamber a carne por completo, deixando apenas ossos enegrecidos a vista.

O cavalo continua seu caminho, passos lentos, porém seguros e habituais, pois esse cenário não lhe era estranho, pelo contrario, era como passear nos campos próximos ao que conhecemos em nossas moradas.

Outros corpos. Esses o fogo não consumiu, mas teria sido melhor se tivesse, pois a fúria com que foram assaltados foi intensa, as marcas de cortes, profundas em suas peles, que abriam corpos inteiros dos pés a cabeça, deixando membros separados de seus donos, cabeças penduradas como troféus, pernas que tomavam lugar de braços e braços que tomavam o lugar de pernas, um macabro quebra-cabeças, muito possivelmente montado enquanto as peças ainda lutavam para viver.

A pata do cavalo toca o fim da estrada, o que restou do vila são pilhas de pedra e resto de corpos. Poderia se pensar que guerra passou por aqui, mas não é guerra quando apenas um lado tem poder e a força e o resultado da vitória não leva a nenhum espólio.

O cavalo avança, pequenas gotas de sangue respingam de suas patas na grama do caminho que ele percorre, seu cavaleiro assovia um som profundo e raivoso enquanto seus olhos caem sobrem algo no horizonte a frente, o próximo vilarejo.

 

Um choro fraco podia ser ouvido ao longe, criaturas magras e esfomeadas que um dia foram crianças transitam de lixo em lixo atrás de algo que possa ser consumido. O gosto não importa mais, o cheiro muito menos, essas coisas deixaram de importar há algum tempo.

Um velho que está sentado a par de uma cerca abre um pequeno sorriso. Em suas lembranças, ele e seus filhos estavam na festa da colheita. Todos os anos o vilarejo comemorava os frutos do trabalho árduo de todos com uma grande festa, e durante 3 dias todos comiam, bebiam e dançavam antes de estocar os mantimentos para a chegada do inverno.

Todos os habitantes se concentravam na praça da vila em torno de um pequeno palco onde músicos embalavam todos como alegres melodias, nas laterais ficavam grandes mesas com comida e bebida para todos.

Os devaneios do velho mudam, agora a lembrança é mais recente, sentado exatamente onde ele estava agora, ele observa o mar de cavalos que se aproxima, o comandante dos soldados exige que todos os homens em condições sejam incorporados as fileiras de sua infantaria e que suprimentos sejam fornecidos para alimentar o exército.

A criança se aproxima da cerca e senta ao lado do velho, um minúsculo pedaço de pão enegrecido rola entre seus dedos. O velho quase sente o gosto do pão em sua boca. A criança entrega o pão na mão do velho, então ele sorri e pergunta;

- Não está com fome?

A criança não esboça reação e permanece imóvel, sentada ao seu lado.

Pessoas se arrastam pelas ruas em meio à lama, excrementos e corpos já sem vida. A entrada daquele galpão, um antigo armazém de sementes, agora serve como abrigo e hospital. A doença, parte inevitável da vida, tomava nestes tempos de guerra uma proporção inesperada e perigosa. A fome leva pessoas a tomarem medidas desesperadas, e quando não se encontra a caça desejada, todo o resto serve: ratos, corvos, restos, são prelúdios felizes para o epílogo do canibalismo.

 

Homens carregando mulheres, mulheres buscando crianças; o galpão estava abarrotado de gente. A lamúria podia ser ouvida ao longe. Choro, tosses e gritos caracterizavam o som do ambiente. Os responsáveis por tratar os doentes já não sabiam o que fazer. Como era possível uma simples gripe ser tão devastadora? Ferimentos leves levavam à necrose, e nada estava se comportando como deveria, e remédio algum parecia ter efeito. Os tratamentos conhecidos pela medicina de nada serviam.

 

O chefe do departamento médico corria escada abaixo. Mandaram que o chamassem, seu filho que amanhecera bem e sorrindo havia chegado há pouco, com febre e desmaios. Ele corre para a entrada e ordena a duas enfermeiras que urgentemente preparem um lugar para acomodar a criança. Quando a porta se abre, a mulher do médico entra com o filho nos braços. Logo atrás dos dois, o médico avista algo que o fez tremer. Um homem alto estava parado a poucos passos da entrada. Aparentava ser outro médico, cujo uniforme era semelhante ao do primeiro, a não ser pela cor negra. A sombra de seu chapéu cobria boa parte do rosto. Na penumbra do semblante escondia-se um sorriso inconveniente. Lentamente, o visitante abre sua maleta e dela retira uma máscara, branca e com um longo espaço para o nariz. O homem a coloca no rosto, e dirige-se ao médico:

 

- Parece que vocês precisam de um pouco de ajuda.

 

O sorriso permanece em seu rosto, em ar de deboche.